IFA- Impacto femuro-acetabular


 

INTRODUÇÃO

O quadril é uma articulação complexa do ponto de vista biomecânico e está sujeito a estresse constante decorrente do suporte de peso corporal. Pode ser acometido por afecções congênitas, degenerativas, inflamatórias, traumáticas e neoplásicas, sendo o procedimento cirúrgico, em muitas situações, incluído na terapêutica.

Nas últimas décadas, a avaliação por imagem dessa articulação apresentou notável avanço, principalmente com o advento da tomografia de multidetectores (TCMD) e da ressonância magnética de alto campo (RM). O uso de reformações multiplanares e 3D viabilizadas pela TCMD e a realização de artrorressonância magnética (artro-RM) fornecem informações importantes para o manejo das afecções do quadril, que no passado não faziam parte do cotidiano do radiologista. Além disso, com o desenvolvimento dos procedimentos artroscópicos na última década, a avaliação por imagem dessa articulação passou por uma importante curva de aprendizado.

Em tempos de aparelhos de última geração, entretanto, a radiologia convencional permanece como peça fundamental, sendo o seu uso aliado aos demais métodos de imagem um desafio para o radiologista. Nesse contexto, procuramos estabelecer um protocolo de avaliação por imagem do quadril, que tem sido resultado de trabalho conjunto com alguns serviços de referência em ortopedia nos últimos oito anos.

 

CONCEITOS

Impacto femoroacetabular

A principal função do lábio acetabular é promover uma pressão intra-articular negativa, que permite uma distribuição homogênea do líquido intra-articular, aumentando a lubrificação fluida, prevenindo o contato direto das superfícies articulares e distribuindo a força aplicada sobre a cartilagem hialina.

A porção anterior e anterossuperior da junção condrolabral apresenta uma maior predisposição a lesões labrais, podendo-se citar como causas possíveis uma maior demanda mecânica e a hipovascularização do lábio nessa região. Com a rotura labral, haveria alteração da biomecânica do quadril, determinando erosões condrais e iniciando o processo degenerativo articular.

Dentre as causas de lesão labral, destaca-se o impacto femoroacetabular (IFA), que pode ser dividido em dois tipos: pincer e cam. O primeiro é decorrente do impacto repetitivo entre o lábio acetabular e a transição cabeça/colo femoral nos casos de excesso de cobertura acetabular (retroversão acetabular e coxa profunda/protrusa), sendo o lábio a estrutura mais vulnerável da cadeia fisiopatológica. Predomina na faixa etária dos 20 aos 40 anos, particularmente nas mulheres, ou em mulheres jovens no início da atividade esportiva. Dentre as causas de protrusão acetabular, podem-se citar, ainda: osteoporose, osteomalácia, osteogênese imperfeita, artrite reumatoide, Paget, hipofosfatemia ou idiopática (pelve de Otto). O tipo cam está relacionado à perda da concavidade da transição cabeça/colo femoral, que determina impacto na porção anterossuperior da cartilagem acetabular, com posterior erosão condral e destacamento do lábio adjacente. Esta perda de concavidade é vista ainda nos casos de epifisiólise da cabeça femoral, sequela de Legg-Perthes e de fratura no colo femoral.

Radiologia convencional

As incidências radiográficas que podem ser utilizadas na propedêutica do IFA são: a) radiografia de frente da bacia em ortostase e decúbito dorsal; b) Lauenstein; c) Lequesne; d) Ducroquet; e) Cross table ou perfil de Arcelin; f) Dunn.

a) Radiografia de frente da bacia em ortostase e decúbito dorsal

O paciente é posicionado em ortostase, com rotação interna dos pés (cerca de 15º), sendo a radiografia centrada a 2 cm acima da sínfise púbica. A rotação interna faz com que o trocanter maior não se sobreponha ao colo femoral. Os forames obturatórios e as asas dos ilíacos devem estar simétricos e o cóccix alinhado com a sínfise, distando no máximo 2,5 cm.

Nesta incidência avaliam-se: ângulo colodiafisário; ângulo de cobertura acetabular; coxa profunda; retroversão acetabular; transição cabeça/colo femoral. O ângulo colodiafisário é formado pela intersecção das linhas traçadas ao longo dos eixos do colo e da diáfise femoral (valor normal: entre 125 e 140º; acima de 140º, coxa valga; abaixo de 125º, coxa vara). O ângulo de cobertura acetabular é formado pela intersecção de duas linhas a partir do centro da cabeça femoral, uma delas perpendicular e outra tangenciando o rebordo acetabular (valor normal: entre 25 e 40º; acima de 40º, indica excesso de cobertura acetabular; entre 20 e 25º, déficit de cobertura; abaixo de 20º, acetábulo displásico).

b) Incidência de Lauenstein (posição de rã)

O paciente é posicionado em decúbito dorsal, em abdução e rotação externa máxima dos quadris, com a planta dos pés justaopostas, tendo como principal objetivo a avaliação da porção anterossuperior da cabeça femoral, nos casos em que há suspeita de fraturas subcondrais ou osteonecrose.

c) Falso perfil de Lequesne

O paciente é colocado em ortostase, com o quadril de interesse junto ao chassis. A linha entre os ombros do paciente deve estar angulada a 65º, e o pé do lado a ser estudado deve estar paralelo em relação ao chassis. Para saber se a radiografia ficou bem posicionada, deve haver a distância de uma cabeça femoral entre as cabeças. Através dessa incidência, pode-se avaliar o espaço articular nos compartimentos anterior e posterior.

d) Incidência de Ducroquet

O paciente é posicionado em decúbito dorsal, com o quadril fletido a 90º e abduzido 45º, e o raio central deve ser perpendicular à raiz da coxa. Nessa incidência, é possível avaliar a perda da concavidade da porção anterior da transição cabeça/colo femoral nos casos de IFA do tipo cam.

e) Incidência cross table ou perfil cirúrgico de Arcelin

Paciente em decúbito dorsal, com o membro inferior de interesse estendido e flexão máxima do contralateral, com distância foco-filme de cerca de 1,2 m e com o raio horizontal angulado 45º cefálico, centrado na raiz da coxa. É de fundamental importância no estudo do impacto do tipo cam, para a avaliação da porção anterior da transição cabeça/colo femoral, com o cálculo do ângulo alfa nos casos duvidosos. Para o cálculo do ângulo alfa: traça-se um círculo na cabeça femoral; a partir do centro deste círculo, traçam-se duas linhas, uma no sentido do eixo do colo femoral e outra até o ponto onde a cortical da porção anterior da transição cabeça/colo perde o contato com o círculo (valor normal: < 55º).

f) Incidência de Dunn

A incidência de Dunn é uma variante da incidência de Ducroquet, realizada com o paciente em ortostase, com o quadril fletido a 45º e abduzido a 20º, sendo que o raio central deve ser perpendicular à raiz da coxa. É útil na avaliação da porção anterossuperior da transição cabeça/colo femoral.


 

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